segunda-feira, 20 de junho de 2011

Entrevista: humorista Bruno Motta

Entrevista realizada no dia 07/06/2011 para o Brasil Diário.

Bruno Motta, humorista e diretor da stand up comedy Improrisos, falou com exclusividade ao Brasil Diário e revelou que o humor sofre uma censura velada no Brasil.

Apesar disso, ele garante nunca ter passado por nenhum momento constrangedor em cima dos palcos.

Motta ainda destacou a simplicidade para se fazer stand up comedy e deu uma dica para quem deseja seguir a carreira de humorista.

Bruno também analisou o novo desafio de sua carreira: ser comentarista de um telejornal. Tudo isso você confere clicando no link abaixo.





O humor sofre uma censura, mesmo que velada?
Sofre uma censura velada, as pessoas só estão preparadas para zoar quando não é no quintal delas. É aquela boa e velha história: “ah não, tem que poder falar de tudo, menos de mim, de mim não pode, só é engraçado quando é com o outro”. E o humor vai ter sempre um alvo. Uma coisa é ter delicadeza, saber o lugar onde você está falando para não ser constrangedor. Outra coisa é cercear a liberdade. Aparecem umas frases malucas, como “liberdade, mas não é tudo o que se pode falar”. Isso não é liberdade. “É liberdade, mas com restrições”. Não, liberdade restrita não é liberdade, é outra coisa. “Ah, pode falar de todo mundo, menos do seu”, é mais ou menos isso. Então, o umbandista ri das piadas dos evangélicos, mas com o umbanda não pode mexer. O evangélico acha super engraçado falar dos judeus, mas com o evangélico não pode mexer. O judeu acha hilário quando vamos falar da Bahia, do candomblé, mas com ele não pode, por que ele faz parte da história. Você pode mexer com política, mas não pode mexer com esse partido que está aí lutando. Não gente, pode fazer humor com todo mundo, presta atenção, é humor. O problema do país não é a gente. O problema do país não são os humoristas, a gente está reproduzindo. Seja um comportamento preconceituoso, seja um comportamento politicamente consternado, a gente está reproduzindo. Nós somos um retrato vivo desse país, a gente tem o pulso da situação, como sempre foi, como Martins Pena é um retrato fiel da sociedade carioca daquela época. E Nelson Rodrigues e tudo mais. É isso que a gente faz. Sem pretensão de ser Martins Pena e Nelson Rodrigues, estamos apenas tomando o pulso da situação. É como culpar o médico que dá o diagnóstico, que faz o óbito, pela morte do cara.

Você já andou por alguns estados. A reação é diferente em cada região?
As reações são diferentes sempre. Elas são diferentes em um teatro onde o público tem um perfil mais alto, no sentido de ser um público mais A, B, é diferente da TV, é diferente do YouTube, onde a pessoa consegue comentar. Ela é sempre diferente. Esse espetáculo, que eu viajo o Brasil hoje, que é meu solo, não muda de lugar para lugar. Eu posso mudar a temperatura do espetáculo, mas não adapto minhas piadas ao lugar. “Qual é a escola que vocês brincam aqui, qual é a faculdade, qual é a rua?”, não tem nada disso no meu espetáculo. Vários têm e não é um problema. Só estou dizendo assim, é a prova de que a temperatura muda e vai sempre mudar, então o meu não muda.

Hoje é mais fácil ser humorista do que antigamente?
Não. Aumentou a profissionalização, tem mais gente fazendo. No stand up, quando a gente começou, era difícil por que não existia, mas era só a gente. Hoje tem muita gente, tem que observar muito o mercado.

Você é formado em publicidade e já estudou jornalismo. Quando você descobriu que o humor era a sua área de atuação?
Antes de fazer isso tudo. Sempre fiz teatro, desde criança, sempre fiz eventos, festival, intercolegial, depois parti para o humor. No final dos anos 90 teve um pequeno “boom” de festivais de humor, de competição, ai eu comecei a participar, fui ganhando boas classificações, quinto, depois terceiro, depois vencedor. Conheci gente bacana, que incentivava, como o Chico Anísio. Eu sempre quis fazer isso, mas a carreira foi passo-a-passo, nunca tive um dia de sorte fazendo competição no mercado e alguém me descobriu na televisão. Não foi assim que eu conheci o Chico, eu conheci fazendo festival, passo-a-passo.

Qual foi o momento mais difícil para você?
Gravar com o Chico pela primeira vez é difícil. De repente, “o cara” está na sua frente, tentando sempre ajudar, te dando as deixas e você está ali “nossa, estou do lado do Chico”.

Você já passou por algum momento constrangedor em cima do palco?
Não, eu evito ao máximo, esses momentos existem, mas eu só subo ali em cima com planos A, B, C e D. Meu plano de vida é não passar momento constrangedor no palco. O improviso ensina muito, tem uma frase que é “não existe erro”. Errar é inevitável, então, se acontece alguma coisa fora do plano, você transforma aquilo em parte do espetáculo. Nesse sentido, você conduz para que jamais seja constrangedor. Você planeja, entra lá e se acontece alguma coisa fora do previsto, você transforma em parte da brincadeira.

Você faz parte do Jornal da Record News. Como é para um humorista fazer parte de um programa jornalístico?
É curioso, mas a gente está se entendendo. Eles contrataram para ser destacado, para ser diferente.

E como você reagiu quando surgiu esse convite?
Eu fiquei surpreso. Estou sempre comentando as notícias mesmo, é o meu campo de atuação, mas fiquei surpreso por ter vindo de um jornal.

Você acha que é uma tendência e acabará virando moda?
Tomara. Vou ficar orgulhoso, mas vamos ver o que acontece. Acho bom. Humor é sempre bom para todo mundo que faz humor.

Por que o stand up comedy caiu nas graças do brasileiro?
Primeiro por que as pessoas se identificam muito, a gente fala dos assuntos que elas passam. Por que essa é a essência da comédia stand up, é cotidiano, dia-a-dia, então acontece com pessoas normais e elas passam por isso também, a identificação é muito grande. Segundo que teve um grande avanço no Brasil, que foi o crescimento da internet. O crescimento da comédia stand up no Brasil é análogo ao da internet, por que tornou muito tangível o boca-a-boca, eu passo a informação para você do que é e mando para você um link com um vídeo. A comédia stand up é muito conduzida pela voz, então é fácil filmar, não precisa de uma grande produção. Se eu estou ouvindo o que o humorista está falando, é fácil gravar. Então, as pessoas se identificam, a internet avançou muito e a pessoas mandavam os links, fazendo um boca-a-boca virtual, chegando muito próximo da pessoa. E terceiro, é fácil reproduzir a comédia stand up. Qualquer bar com equipamento de som se tornou um palco possível para fazer chegar um pouco de arte para as pessoas em lugares distantes.

Fale mais sobre essa simplicidade para se fazer o stand up.
É tecnicamente muito simples, ela iguala muitas pessoas. Você não precisa de uma produção, você não precisa estar em um teatro de cinco mil pessoas. Tem vídeos de comédia stand up no YouTube com pessoas fazendo festivais com mil pessoas e pessoas fazendo isso na própria casa, na sala, desde que seja bom. É muito simples tecnicamente, mas tem uma coisa que todo mundo tem que ter: tem que ser engraçado. As pessoas esquecem um detalhe na comédia.

Qual o conselho você dá para quem quer seguir no ramo humorístico?
Você tem que se lembrar que só é uma piada se outra pessoa ri. Se não, não era uma piada, era outra coisa. Hoje eu passei uma piada que sempre faço, as pessoas não riram, então hoje não era uma piada, era um comentário.

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